O abandono afetivo é uma temática cada vez mais discutida no Direito de Família brasileiro, especialmente diante da valorização da dignidade da pessoa humana e da afetividade como princípios norteadores das relações familiares. A questão central é saber se, em casos de abandono afetivo, há possibilidade de pleitear indenização por dano moral, seja por parte dos filhos contra os pais, ou dos pais contra os filhos.
A Constituição Federal de 1988 estabeleceu a família como base da sociedade, assegurando especial proteção do Estado (art. 226). Além disso, o art. 227 dispõe que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à convivência familiar, dignidade e afeto.
No Código Civil, o art. 1.634 enumera os deveres dos pais em relação aos filhos menores, incluindo a obrigação de dirigir-lhes a criação e educação. Já o art. 1.696 prevê que a obrigação de prestar alimentos é recíproca entre pais e filhos.
Essas normas evidenciam que não apenas a subsistência material, mas também o cuidado afetivo integra o núcleo essencial do dever familiar.
A jurisprudência brasileira já reconheceu, em situações específicas, a indenização por abandono afetivo praticado por pais contra filhos.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), no REsp 1.159.242/SP, firmou entendimento de que a omissão no dever de cuidado pode gerar indenização, desde que demonstrados o vínculo jurídico de filiação, a conduta omissiva de abandono, o dano efetivo (traumas psicológicos, sofrimento, prejuízo social) e o nexo causal.
O fundamento central é a violação ao dever jurídico de cuidado, que transcende a mera obrigação alimentar, abrangendo também o suporte emocional e psicológico indispensável ao desenvolvimento saudável do filho.
Contudo, o STJ ressalta que a indenização não se confunde com a obrigação de amar: não se indeniza a falta de afeto em si, mas o descumprimento do dever legal de cuidado e presença.
Também se discute a possibilidade inversa: pais idosos ou em situação de vulnerabilidade emocional e social podem pleitear indenização por abandono afetivo praticado pelos filhos?
A legislação brasileira impõe aos filhos o dever de amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, conforme art. 229 da Constituição Federal e art. 1.696 do Código Civil.
Assim, além da obrigação alimentar, há um dever moral e jurídico de assistência e convivência. Em alguns julgados, tribunais têm admitido pedidos de indenização de pais contra filhos em casos de abandono, especialmente quando comprovado o sofrimento psíquico e a violação da dignidade da pessoa idosa.
Embora ainda seja mais raro que a responsabilização de pais em favor dos filhos, há precedentes que abrem caminho para a efetiva responsabilização civil dos filhos omissos, em consonância com o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003).
Apesar dos avanços, a doutrina e a jurisprudência divergem sobre a extensão dessa responsabilização.
Críticos alegam que a condenação por abandono afetivo judicializa relações familiares e invade a esfera íntima, transformando afeto em obrigação patrimonial.
Defensores sustentam que a responsabilização tem caráter pedagógico, reforçando a função social da família e a dignidade da pessoa humana.
Assim, cada caso deve ser analisado individualmente, com rigor probatório, para evitar banalização do instituto.
O abandono afetivo é, antes de tudo, uma violação à dignidade e ao direito fundamental à convivência familiar. Tanto filhos quanto pais podem, em tese, pleitear indenização por dano moral em casos de abandono efetivo, desde que comprovados os requisitos da responsabilidade civil que são: conduta omissiva (não praticar uma ação exigida por lei, por um dever jurídico ou por uma obrigação moral e legal), dano (prejuízo psicológico, emocional, social etc.) e nexo causal (ligação entre a conduta omissiva e o dano).
A jurisprudência já consolidou o direito de filhos contra pais, e, embora mais incipiente, há abertura para reconhecer também a possibilidade inversa.
É importante que os envolvidos busquem orientação jurídica especializada para avaliar a viabilidade do pleito, sempre priorizando soluções que preservem a dignidade humana e a proteção integral da família.
O Escritório Martiniglei Aguiar Advocacia encontra-se à disposição para prestar esclarecimentos nesta área, uma vez que dispõe de profissionais especializados em Direito de Família, capacitados para fornecer informações detalhadas sobre o tema.
Referências: Constituição Federal de 1988, Código Civil Brasileiro, Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003), STJ, REsp 1.159.242/SP, Jusbrasil.com.br.